Notícias Fei

Inovação é uma questão de sobrevivência da indústria química

Inovação é uma questão de sobrevivência da indústria química


  14/08/2018

Presidente regional da Evonik América do Sul e Central, Weber Porto fala sobre os desafios da indústria química e sua formação na FEI

No ano em que concluía sua graduação em Engenharia Química, em 1981, Weber Porto teve que enfrentar a mesma dificuldade que muitos jovens recém-formados enfrentam atualmente: a falta de uma oportunidade profissional em um País com sérios problemas socioeconômicos e políticos. A dificuldade, porém, não o desanimou: continuou dando aula de matemática em cursinhos e supletivos – para custear seus estudos – até encontrar um anúncio no jornal que dizia: “Procura-se engenheiro químico recém-formado com possibilidade de morar no exterior”. Hoje, 34 anos após conquistar a vaga na empresa Degussa – rebatizada mais tarde como Evonik, uma das maiores indústrias químicas do mundo, com sede na Alemanha, Weber Porto é o presidente regional América do Sul e Central da companhia, posição que ocupa desde 2007.

O executivo, que também coordena o comitê de sustentabilidade da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim) e já foi contemplado com o prêmio de Personalidade do Ano, da Câmara Brasil-Alemanha de São Paulo, conta em uma entrevista exclusiva à Domínio FEI os desafios de sua carreira e também do setor químico no Brasil.

Domínio FEI: Coincidência ou não, mas no ano em que você se formou, o Brasil passava por um período crítico semelhante ao que estamos vivendo. Mas o que mudou de lá para cá?

Weber porto: Eu acho que mudou apenas a forma. As crises são momentos em que as empresas, talvez por falta de previsibilidade, acabam reavaliando seus contratos, quadros de funcionários, custos. Então, como acontece hoje, praticamente ninguém contrata, a menos que exista uma necessidade enorme, novas posições. O que às vezes acontece é uma troca de posições por conta de alguém que não está apresentando uma boa performance. Mas novos empregos hoje são muito difíceis. O mesmo acontecia nos anos 1980. Essas situações são cíclicas, se repetem por motivos diferentes, mas no final as consequências são praticamente as mesmas, que é uma retração de mercado, uma insegurança dos investidores e uma contenção de despesas.

Embora o período que estamos passando seja complicado, a Evonik inaugurou recentemente uma fábrica no Brasil, certo?

Trouxemos três fábricas. O Brasil tem alguns mercados fortes. Uma das nossas fábricas, em Americana, é de ingredientes principalmente para indústria de cosméticos. O Brasil é o terceiro maior mercado de cosméticos do mundo, depois dos Estados Unidos e Japão. A população tem um costume diferente de cuidados pessoais, diferente da Europa, por causa do clima, principalmente.

A outra indústria em que investimos é de aminoácidos. Montamos uma fábrica de biotecnologia no Paraná. E o Brasil é competitivo em biomassa e açúcares, seja cana-de-açúcar ou milho. O País é o maior exportador mundial de proteínas, e a Evonik é a maior produtora mundial de aminoácidos para ração animal.

A outra fábrica é de sílica, usada para fazer o pneu verde. A sílica é um agente reforçante para borracha. Quando você substitui uma parte do negro de fumo pela sílica com silanos, você ganha outras características: a resistência à rolagem do pneu é menor, então gasta menos combustível sem perder as outras características importantes. Ecologicamente é melhor, por isso se chama pneu verde. Todos os grandes produtores mundiais de pneu estão aqui; a indústria automobilística é grande no Brasil.

Decidimos investir em mercados que consideramos que continuariam estáveis, independentemente do que poderia acontecer em relação à economia e política brasileiras. São decisões tomadas e pensadas em longo prazo. Não são decisões oportunistas.

Em sua opinião, quais os maiores desafios da indústria química?

A sustentabilidade é vital para a indústria química. É um negócio. Sustentabilidade não é apenas idealismo – se fosse, não sobreviveria. Você diminui a emissão de gases pela economia de combustível. Nisso, a indústria química é vital: nós a consideramos a indústria das indústrias. Afinal, tudo o que você vê tem química.

A indústria química do Brasil é a oitava maior do mundo e tem uma importância muito grande no PIB do País. Mas temos uma estrutura de matéria-prima complexa, por conta do monopólio da Petrobras, então é uma indústria não competitiva internacionalmente devido ao custo de matéria-prima.

Para a indústria química crescer, ela poderia aproveitar toda essa tendência do pré-sal, com a qual teremos muita matéria-prima. Mas precisamos de uma política industrial que envolva a Petrobras e que tenha foco no desenvolvimento da indústria química – caso contrário, dificilmente ela crescerá no Brasil, tanto que é deficitária há muitos anos.

Um dos objetivos da Evonik é se consolidar como um dos grupos industriais mais criativos do mundo. Nesse negócio, o que vocês chamam de criatividade?

Estamos falando de inovação, trazer produtos novos, soluções novas. O que a Evonik quer é sempre ser líder no desenvolvimento de novos conceitos e ideias. Porque inovação é uma questão de sobrevivência da indústria química: se você não tiver um processo de inovação muito bem estabelecido, em pouco tempo, você deixa de ser competitivo, porque o mercado muda.

O que faz a longevidade das empresas, na minha avaliação, está ligado exatamente à sua capacidade de inovar o tempo todo. Por isso, queremos ser uma das empresas mais inovadoras do mundo.

E como a companhia vem cumprindo essa premissa?

Somos muito exigentes conosco. Temos feito reavaliações dos produtos, daquilo que acreditamos ser importante ou não; temos feito aquisições de outras empresas, que têm produtos que podem trazer mais conhecimento, para que possamos cada vez mais fazer coisas diferentes e melhores.  Estamos muito determinados nessa direção.

O que você enxerga para a indústria química no futuro?

Nós acreditamos que a indústria química vai ter um papel fundamental em todo esse processo de desenvolvimento futuro. Dentro de sustentabilidade, por exemplo, temos um crescimento populacional absurdo e a necessidade de produzir mais alimentos para diminuir a fome. Como se faz isso? Com maior produtividade no campo. Quem traz maior produtividade no campo ou mais proteína, como carnes e frango? A química tem uma responsabilidade enorme nisso.

Se pensarmos na questão de energia ou prédios inteligentes, o que você tem nesses edifícios? Um polímero entre vidros que faz com que não se perca o frio gerado pelo ar-condicionado e nem deixe entrar muito calor. Isso também é um produto químico, que evita o desperdício de energia.

Nós pensamos muito na cadeia de produção, e não no produto em si. Depois refletimos sobre o que a indústria química pode oferecer na cadeia para viabilizar essa ideia. Por isso, consideramos a química como vital em todos esses processos. É difícil você enxergar uma cadeia onde não exista de alguma forma uma participação da indústria química, seja no que for.

E para acompanhar todos esses desenvolvimentos, a inovação é vital. Nós sempre estamos pensando em curto prazo, que é fazer negócios, e também em médio, longo e longuíssimo prazo, tentando imaginar o que vai acontecer.

Existe um imaginário de que o brasileiro é muito criativo. Você acredita que esse traço da população se reflete na forma como se fazem negócios no País?

Criatividade é um dos pontos. O brasileiro é muito criativo, consegue improvisar, e isso às vezes dá certo. Mas isso não pode ser alguma coisa que sempre acontece, porque precisamos de organização também. Criatividade sozinha não vira nada concreto; criatividade com organização é inovação. O brasileiro tem essa propriedade, que tem que ser aproveitada para a geração de ideias.

É muito interessante analisar a experiência de trabalhar com brasileiros e com outros povos, como o alemão, que tem uma forma de atuação bem diferente. Trabalhar no Brasil é uma delícia, porque é muito fácil motivar as pessoas. Estão todos sempre muito abertos a novas ideias. As pessoas se empolgam. Enquanto o alemão é sempre muito resistente, quer examinar, ver com profundidade quais são as consequências dessa ideia, onde ela vai levar, o que vai trazer.

Você já ganhou prêmio de Personalidade do Ano, da Câmara Brasil - Alemanha de São Paulo. Então, além dos negócios, imagino que tenha algum tipo de relação com o País, certo?

Fui presidente da Câmara durante quatro anos. Eu me identifiquei muito com a cultura alemã – e a cultura industrial alemã é muito interessante, com grandes empresas. E São Paulo é a cidade onde existe a maior concentração de indústrias alemãs do mundo fora de lá, por conta de investimentos nos anos 1950 e 1960. É um ambiente em que eu me senti bem e comecei a me empolgar nesses trabalhos com a Câmara, para tentar trazer negócios aqui para o Brasil. Foi uma época muito boa para o País, com a vinda de muitas delegações econômicas.

Eu presido também uma sociedade beneficente alemã chamada SBA (Sociedade Beneficente Alemã). Temos um residencial para idosos, uma creche e um centro profissionalizante. É muito gostoso você poder dedicar um pouco de tempo para essas pessoas que necessitam. Então, talvez, por esse contexto todo de ter atuado tão fortemente na Câmara e em instituições alemãs, decidiram me dar esse prêmio. Foi uma alegria enorme. Eu já tinha entregue esse prêmio quatro vezes para outras pessoas, porque é o presidente da Câmara que entrega. Então, para mim, era a quinta vez, mas de uma forma totalmente diferente, muito melhor, porque fui receber. Fiquei absolutamente honrado por isso!

A Evonik tem parceria com um time de futebol, não? Como surgiu?

Sim, com o Borussia, um time espetacular na Alemanha. É o time com maior torcida, muito envolvida e presente, com um estádio lotado no ano inteiro. Fica perto de onde é nossa matriz.

Quando fizemos a troca de nome da empresa para Evonik, há dez anos, queríamos entrar na bolsa de valores da Alemanha. Precisamos, então, encontrar uma forma de expor o nome da empresa de um jeito bem atraente ao mercado, e chegamos à conclusão de que poderia ser por meio desse time, que é tão conhecido no país.

Foi excelente, porque o nome da Evonik ficou conhecido no mundo inteiro – não sei se todo mundo sabe o que a companhia faz, mas sabe que está ali na camiseta do Borussia, e isso já é importante para nós. A ideia foi criar uma imagem, e esse time é extremamente interessante, porque existe um fanatismo, um amor dos seus fãs que é inacreditável, inclusive eles têm um slogan que significa “o amor verdadeiro”, e isso combina com nossa filosofia, a paixão pelos negócios. Foi uma associação que deu muito certo e que a gente pretende continuar.

Também trouxemos no ano passado a escolinha de crianças do Borussia aqui para o Brasil, para um programa social que é uma escolinha de futebol para crianças carentes. Trouxemos os treinadores do Borussia e fizemos um evento com cem crianças das comunidades, com um treinamento de um dia e meio.

A responsabilidade social é um assunto que anda em evidência nas empresas. Como é possível fazer com que o tema não seja só um discurso?

Não acho que seja só um discurso. Existem trabalhos muito bons de várias empresas nesta questão de inclusão social. Acho que todas as grandes companhias fazem isso de alguma forma – umas mais, outras menos.

O problema é que as dificuldades também são grandes. É muito difícil resolver, por exemplo, o problema de educação no Brasil. Nós, como empresa, não temos como fazer isso; é uma questão de gerações, de governo. Mas nós temos feito o nosso papel. Se cada um fizer uma parte, no conjunto acabamos contribuindo bastante.

Estou bem mais otimista nesse sentido. Às vezes, as iniciativas têm pouca visibilidade, mas a gente não procura visibilidade, a gente faz porque quer fazer e porque acha que tem que fazer.

Sua carreira como engenheiro foi construída inteiramente na Evonik?

Minha carreira inteira foi nesta empresa, mas eu nunca trabalhei como engenheiro!

Isso serviu como bagagem para o seu desenvolvimento?

Absolutamente! Entrei na área de Marketing, que usava todo o conhecimento técnico para trazer novos produtos para o Brasil e analisar os mercados, desde a disponibilidade de matéria-prima até a capacidade de produção, um foco fora da indústria, mas sempre usando os conhecimentos para poder identificar oportunidades e trazer investimentos.

Para finalizar, qual foi o papel da FEI em toda a sua história?

Eu tenho uma imagem muito positiva da FEI. Todo mundo falava que era muito difícil concluir (risos). Era uma escola onde você tinha que se virar muito sozinho, ser independente, buscar as coisas. A grande vantagem disso é que você se prepara para o mundo real que vem depois da faculdade. A FEI, sem sombra de dúvidas, prepara as pessoas para enfrentar os desafios de uma forma muito mais forte. É isso que a gente já sentia na época. Você aprende muito nas dificuldades, aprende a se reinventar, a se superar.

Eu trouxe um pouco disso para minha vida pós-universidade, e isso sempre me ajudou bastante. Temos vários colaboradores aqui que vêm da FEI – se dependesse de mim, só teria feianos (risos). Meu filho não fez engenharia, mas se tivesse feito, seguramente eu teria recomendado a FEI exatamente por esses aspectos. É uma escola de engenharia e uma escola de vida.