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Partiu buscar vida em Marte

Partiu buscar vida em Marte


  05/08/2020

O professor de Física da FEI e Astrônomo, Cassio Barbosa, fala sobre a tecnologia desenvolvida para a missão espacial que partiu recentemente para buscar vida em marte.

O dia  30 de julho de 2020 entrará para a história como o dia em que a humanidade enviou até o planeta Marte uma sonda que terá como objetivo achar qualquer tipo de vida o restígio de atividade no planeta vermelho. O jipe Perseverence, já apelidado de Persy, enfrentará uma jornada de mais ou menos 7 meses até chegar ao planeta vermelho e deve passar a maior parte desse tempo em hibernação, afinal não tem muita coisa a se fazer até lá. Mas ao pousar, em meados de fevereiro a coisa muda radicalmente, aliás, já teremos emoção no pouso!

O jipe carrega uma suíte de 7 instrumentos, 2 microfones e 19 câmeras, além de uma pequena bateria atômica para fornecer energia sem depender da luz solar. Isso dá ao Persy mais de uma tonelada de massa e os métodos tradicionais de frenagem para o pouso suave não dão conta. Ao ser capturado pela gravidade de Marte, o módulo de pouso executa uma primeira desacelerada ainda em órbita e adentra a atmosfera. Entra em ação o aerobraking, quando o arrasto atmosférico efetua a redução de velocidade do módulo, com a proteção de um escudo térmico.

Depois dessa etapa, o escudo é ejetado e entra em ação um paraquedas. O problema é que ambas as etapas dependem do arrasto atmosférico, que é muito baixo, já que a atmosfera marciana na sua camada mais densa é apenas 1% da atmosfera terrestre. A mais ou menos mil metros de altitude, o módulo de pouso dispara 6 retrofoguetes para reduzir a velocidade de 300 km/h. Durante a descida, o jipe se desprende do módulo e fica pendurado a uma distância de 7,6 metros do suporte dos foguetes. Isso é para evitar que a exaustão dos retrofoguetes levante poeira que possa danificar os instrumentos do jipe. Quando ela tocar o solo, o guindaste plana por 2 segundos enquanto a telemetria da suspensão confirma o pouso em solo firme. Se isso de fato acontecer, o guindaste solta os cabos do jipe e se afasta rapidamente para se espatifar a mais de meio quilômetro de distância, se não ocorrer nessa tentativa, o guindaste decola e repete o processo em outro lugar.

Todo esse processo acontece durante sete minutos e é conhecido na NASA como ‘os sete minutos de terror’. Essa será a segunda vez que esse método de pouso será tentado, a primeira foi em 2012 com o jipe Curiosity. Aliás, o medo que esse processo falhasse era tanto que foram feitos 2 chassis para o Curiosity e se ele se espatifasse, o outro chassi seria usado posteriormente. Como o pouso foi um sucesso, o chassi reserva virou uma nova missão e assim nasceu o Persy!

Para essa nova missão, a NASA escolheu um local de pouso bem mais acidentado, mas também, bem mais interessante do ponto de vista da astrobiologia. A região da cratera Jezero parece ser a foz de um rio que no passado desembocava em um grande lago. O potencial para se encontrar evidências de vida microbiana, nem que sejam evidências fossilizadas, é muito grande. Além disso, o Perseverance irá coletar amostras do subsolo e vai encapsula-las para serem resgatadas em uma missão futura.

Mas o grande atrativo dessa missão é um carona do jipe, um ‘martecóptero’!

O Ingenuity é um helicóptero que irá testar a tecnologia de voo em Marte. A ideia é que as próximas missões levem um veículo voador, além de um terrestre, para apoio na missão. As vantagens são muitas. Por exemplo, o ‘martecóptero’ pode sobrevoar rochas e barrancos inacessíveis aos jipes, fazendo imagens ou mesmo recolhendo amostras para análise. Outra funcionalidade muito útil para os drones seria fazer o mapeamento do terreno adiante do jipe, para que o controle da missão pudesse ajustar o melhor percurso pela superfície com mais antecedência. Dado o alcance limitado das câmeras, atualmente o comando analisa imagens de curta distância e, se algum obstáculo não puder ser transposto, é preciso parar as operações para fazer uma reanálise da trajetória.

O lançamento, ocorrido perto das 09:00 do horário de Brasília, ocorreu sem nenhuma intercorrência e em menos de 40 minutos o módulo de cruzeiro passou a se comunicar com a Terra. A partir desse momento, o controle da missão passou para o Laboratório de Jato Propulsão da NASA e dois contratempos foram identificados.

O primeiro beira a ingenuidade (sem trocadilho com o nome do helicóptero): as antenas da Rede de Espaço Profundo, destinadas a captar sinais de sondas distantes, estavam saturando com o sinal de um jipe ainda nas vizinhanças da Terra. Rapidamente uma solução bem prosaica foi conseguida: apontar as antenas para o lado do módulo de cruzeiro, de modo a atenuar o sinal recebido. Já o segundo contratempo deixou os engenheiros um pouco mais preocupados, já que uma medida da temperatura externa do radiador de calor deixou o módulo em modo de segurança. Nesse estado, todas as funções não essenciais são desativadas e apenas o computador central e o sistema de comunicações permanecem funcionando.

De acordo com um comunicado da NASA já no começo da madrugada no Brasil, quando o módulo adentrou na sombra da Terra, sua temperatura externa caiu bastante e muito rapidamente. Isso fez com que o computador disparasse um alerta, interrompendo todas as funções e acionando o modo de segurança para que os engenheiros da missão pudessem avaliar se a queda de temperatura causaria algum dano ao equipamento. De acordo com as especificações do jipe a resposta é não e trata-se apenas de um excesso de zelo.

Agora são 7 meses de viagem até que o módulo de cruzeiro seja capturado pela gravidade de Marte. Quando isso acontecer, bastará algumas manobras para acertar a velocidade e o ângulo de penetração na atmosfera e então se iniciará a etapa mais perigosa da viagem, o pouso. Isso vai acontecer dia 18 de fevereiro de 2021, mas a torcida para que tudo saia como planejado já começou!

Cassio Barbosa
Professor de Física do Centro Universitário FEI e Astrônomo