Notícias Fei

Em busca de soluções no setor de energia

Em busca de soluções no setor de energia


  09/06/2020

O engenheiro Fábio Nossaes, formado em Engenharia Mecânica pela FEI, fala sobre os desafios frente a presidência da GE Gride Solutions

A GE Grid Solutions, líder global em soluções, produtos e serviços para transmissão e distribuição de energia, opera em mais de 80 países com tecnologias que equipam 90% das empresas no mundo. Presente em sete países da América Latina e há 100 anos no Brasil, a companhia foca no desenvolvimento e na fabricação de produtos para as redes de energia. Em abril de 2019, o engenheiro Fábio Nossaes, formado pelo Centro Universitário FEI em 1997, assumiu a presidência da GE Grid Solutions para a América Latina com o desafio de conquistar novos mercados e consolidar os já existentes.

O executivo de 45 anos, que escolheu a Engenharia Mecânica porque gostava de motores e acabou se encantando pelo mercado de energia, é responsável por um negócio que movimenta de US$ 500 a US$ 750 milhões por ano, e conta neste entrevista exclusiva a revista Domínio FEI, um pouco sobre sua carreira, formação e desafios.

O senhor assumiu a presidência da GE Grid Solutions com o desafio de liderar a organização para posicionar o negócio, estabelecer e manter relações produtivas com clientes visando o crescimento. Como pretende atingir essas metas?

A GE do Brasil está comemorando 100 anos em 2019 e já estamos muito bem estabelecidos na América Latina, com presença em sete países – Brasil, Chile, Colômbia,  Argentina, México, Panamá e Peru – e aproveitando para entrar, oportunamente, em países onde ainda não temos uma base instalada, como a Costa Rica, por exemplo. Temos nossas raízes muito fortes na região, com times operacionais, clientes e uma longa lista de projetos executados e em execução. Nosso primeiro objetivo na região é crescer e, para isso, focamos no desenvolvimento de produtos e de tecnologias, além de atrair e desenvolver talentos, acompanhando os mercados emergentes de geração e transmissão por esses principais países da América Latina. Brasil e México são as nossas principais unidades; Chile e Colômbia são o segundo grupo; Argentina e Peru estão no terceiro e os demais países apresentam ainda pequenos volumes de negócios e projetos pontuais.

Qual é a importância da América Latina para o negócio global da empresa?

Hoje, a América Latina representa em torno de 10% das vendas mundiais. Vendemos produtos na região que são fabricados no Brasil e em todas as nossas outras unidades no mundo. A importância da América Latina está relacionada à venda e alavancagem do negócio, assim como em fornecer produtos e tecnologias para outros mercados. Produzimos equipamentos para redes elétricas e, assim como importamos para os projetos locais, exportamos projetos para fora da América Latina. Temos três fábricas no Brasil – Canoas, perto de Porto Alegre; Itajubá, em Minas Gerais; e uma fábrica de automação em Florianópolis.

Como está o mercado e quanto pode crescer nos próximos anos para que a Grid Solutions atinja as metas?

O mercado da América Latina, se pensarmos apenas em transmissão e distribuição, representa algo em torno de US$ 4 bilhões. Estamos conseguindo uma boa fatia disso, mas esperamos crescer ao complementar a parte de geração com nossas soluções de Grid. Agora que fazemos parte da GE Renewable Energy e temos, além de grid (transmissão de energia), os negócios de geração de energias renováveis como eólica, hidrelétrica, solar e híbridos, temos oportunidade de crescer ao lado desses negócios sempre que tenham novos projetos na América Latina. Antes, fazíamos parte da GE Power – focada em geração térmica – e, por isso, também acompanhamos todo projeto novo desse segmento com soluções e produtos, cobrindo a parte de transmissão de energia. Acompanhamos os leilões e os grandes reforços desenvolvidos nas linhas de transmissão, partes do setor elétrico nas quais estamos muito bem posicionados.

Como é o negócio da Grid Solutions?

A Grid Solutions vende desde produtos ‘mais simples’, como relés de proteção, disjuntores e chaves seccionadoras, até os mais complexos, como grandes transformadores de potência. Também fazemos projetos completos, chamados de turn-key, que incluem engenharias básicas e executivas, além da especificação e o fornecimento de equipamentos e sistemas. Podemos fazer um projeto turn-key que inclui toda a nossa Engenharia e todos os nossos produtos, quando nos associamos a uma empresa de obra civil e montagem. Portanto, vendemos desde um relé de US$ 2 mil até um contrato de projeto turn-key de US$ 100 mil. Temos de 2,5 mil a 3 mil transações por ano.

E qual é a importância dos leilões de energia para os negócios da Grid?

Acompanhamos os leilões com foco no Brasil, mas também temos interesse nos leilões de outros países como Chile, Colômbia e México. Temos dois tipos principais de leilões no setor de energia: um focado na geração e outro na transmissão. Nossa solução de subestação de energia não é o core da parte de geração, mas ainda assim podemos fornecer essa solução para a geradora que vai participar do leilão, para que possa se conectar à linha de transmissão. Já na parte de transmissão, ficamos com o core do leilão e nos associamos a alguns clientes para apresentar nossas soluções de Engenharia e de turn-key, dando suporte no desenvolvimento e no investimento que irão fazer. Não fazemos a parte de linhas de transmissão; nosso foco são produtos e turn-keys subestações. O leilão de transmissão movimenta mais de 50% da nossa operação no Brasil. O governo faz dois leilões por ano e são pontos muito importantes para o nosso crescimento no País. Os próximos já estão marcados e a grande discussão é qual será o volume, quantas oportunidades serão ofertadas e em quantos lotes estarão divididos. Acreditamos que, com as reformas que o Brasil necessita, voltaremos a ter um crescimento mais condizente com um país emergente.

Quais são os principais clientes da Grid Solutions?

Trabalhamos focando principalmente no Brasil, mas alguns desses clientes também estão em toda a América Latina. Atendemos empresas privadas e públicas tanto na área de geração, como Companhia Hidro do Rio São Francisco (Chesf), Furnas, Eletronorte e Engie Brasil Energia, quanto clientes focados só na parte de transmissão, como Isa Cteep e Taesa, por exemplo. Temos uma gama grande de clientes, tanto no Brasil quanto no exterior.

Qual é o seu papel à frente da Grid Solutions na América Latina?

Minha prioridade é ajudar a Grid a crescer na América Latina com a equipe de vendas. Também tenho como objetivo integrar todas as áreas dentro da Grid, ou seja, unir os times que atuam nas fábricas e nas áreas de negócios. Além da liderança para a América Latina, a qual represento, temos líderes regionais de vendas e de execução que respondem por todas as áreas de negócios da Grid.

O que se espera do cenário energético brasileiro e na América Latina para a próxima década?

Há 20 anos era difícil prever tudo o que ia acontecer. Já falávamos e tínhamos uma expectativa de crescimento de eólica e de energia solar. A entrada de toda essa parte de novas fontes de energias renováveis na área de geração, por exemplo, foi muito mais expressiva do que o esperado em todos os países. Por um lado, isso traz uma série de instabilidades para o sistema, com energia de base, mas, por outro, gera uma série de oportunidades para o fortalecimento das linhas de transmissão. Acredito que esse crescimento das fontes deva continuar, e que vamos ouvir falar ainda mais sobre geração de energia distribuída e Smart Grid. As tecnologias estão vindo cada vez mais competitivas e o grande desafio é regular tudo isso, acelerando a entrada de novas tecnologias. No princípio, a eólica tinha incentivo, porque o preço da energia eólica era altíssimo, mas hoje é baixo. Tivemos alguns recordes mundiais de preço de energia solar nos últimos leilões, sendo mais baixos em todo o mundo, em torno de US$ 17 a US$ 20, e temos visto novas tecnologias chegando mais competitivas. A regulação é o um desafio que corre em paralelo com a entrada das novas tecnologias e o objetivo deve ser sempre levar energia ao melhor custo possível e com maior acessibilidade para todas as pessoas.

A chegada dos carros elétricos vai alterar os negócios das empresas de energia?

O carro elétrico vai mudar uma dinâmica de poder mundial que o petróleo tem, incluindo todas as questões relacionadas à energia. Carros elétricos não são uma tecnologia nova. Eu recebi um vídeo do engenheiro João Augusto Conrado do Amaral Gurgel – que era um visionário – indo mostrar o carro elétrico para o Silvio Santos na década de 1970! Hoje, estamos vendo vários exemplos norte-americanos e chineses sobre o custo-benefício do carro elétrico, mas ainda precisam explicar como será a eletrificação das cidades para receberem esses veículos. Se substituíssemos toda a frota que temos hoje por carros elétricos, precisaríamos de outra Itaipu só para carregar esses veículos. Na medida em que esses carros começarem a ganhar as ruas, vai haver uma demanda de energia muito maior do que já temos hoje, o que vai exigir um fortalecimento de todo o sistema. Imagine o que vai acontecer às 18h, quanto todo mundo estiver chegando em casa e, além de ligar o chuveiro e abrir a geladeira, começar a carregar o carro elétrico. Hoje, o sistema não está preparado para isso e, mesmo que o carro elétrico fosse grátis e todo mundo quisesse ter um, quando as pessoas chegassem em casa não iriam conseguir carregar. Portanto, isso precisa ser muito bem balanceado. Viajei por alguns países que estão mais avançados com relação a isso e espero que o carro elétrico chegue antes do carro autônomo, porque é algo em que apostamos muito, porque tem um custo - benefício interessante e é bom para o meio ambiente.

A inteligência artifcial vai permear todas as áreas nas próximas décadas. Como essa tecnologia se insere nos negócios da Grid Solutions?

Na companhia, toda a parte de desenvolvimento de Engenharia continua sendo manual, mas já estamos discutindo como utilizar a inteligência artificial nas áreas de sistemas de energia e segurança. Acho inevitável avaliar como e onde a inteligência artificial se aplica no nosso negócio. Hoje, não temos nenhum projeto piloto específico sobre inteligência artificial, mas temos acompanhado os desenvolvimentos para avaliar de que maneira podemos começar a conectar com o nosso dia a dia. Estamos muito focados na digitalização e padronização, que talvez seja uma etapa antes da inteligência artificial. Estamos desenvolvendo novas tecnologias, novas maneiras de desenvolver projetos e de otimizar custo e tempo. Hoje, nosso principal foco é a digitalização.

Qual é o perfil do engenheiro que interessa para compor sua equipe?

Algo que focamos na Engenharia, principalmente porque trabalhamos com centenas de empresas diferentes, é se o engenheiro tem perfil para entender o cliente. Os nossos clientes também são técnicos e têm expectativas diferentes, portanto, se estamos trabalhando para ‘engenheirar’ uma solução tem de ser junto com o cliente. Temos de saber ouvir o cliente, debater com o cliente, convencer e aceitar a ideia do cliente. Sempre busco aqueles engenheiros que têm boa comunicação, sabem ouvir, sabem falar e sabem chegar a uma solução com o cliente, principalmente porque o nosso objetivo é atender esses diferentes clientes e cada um quer uma solução específica. O engenheiro que consegue valorizar e maximizar a padronização, além de fazer uma customização especial para um cliente, vai cativá-lo. Se há 20 anos olhávamos a Engenharia apenas como área técnica, hoje olhamos como parte da execução e sempre junto com nossos clientes.

A academia está formando mão de obra qualificada para a área de negócios da Grid Solutions?

Acho que a formação é boa, mas nunca vai ser completa. Por isso, é superimportante ter um espaço na agenda para desenvolver uma atividade paralela. Acredito que o estágio tem profissionaliza do muito. Outra questão que considero importante é a possibilidade de parceria entre academia e empresas, o que vai ajudar muito na formação do profissional. E devemos lembrar que é necessário ter uma formação completa, não só uma formação técnica, pensando na passagem do mundo acadêmico para o mundo profissional. Isso é muito importante.

O que um engenheiro mecânico está fazendo na área de energia?

Desde pequeno sempre tive uma paixão muito grande por motores. Eu andava em moto de trilha, desmontava a moto e mexia nos motores. Quando entrei na FEI, meu desejo era desenhar e desenvolver motores. Ao longo do curso fui conhecendo um pouco mais do que era Engenharia Mecânica, e algo que na FEI me agradou muito foi ter uma ideia geral do curso nos primeiros dois anos para depois optar pela área. Entrei na Engenharia Mecânica, saí como engenheiro de produção e acabei tendo uma afinidade muito grande com a área de gestão e de gerenciamento de projetos. Penso que começamos a carreira com algumas ambições, alguns desejos, e vamos ajustando ao longo do caminho.

Uma das ambições era chegar ao posto que o senhor ocupa hoje?

Não, nunca foi. Acho que nunca tive nenhum plano de carreira em médio e longo prazo. Quando comecei na ABB, sempre buscava encontrar alguém em quem pudesse me espelhar dentro da organização. E tinha um diretor na época que havia estudado na FEI, depois fez especialização em Administração e MBA. É uma pessoa que respeito muito, íntegro, inteligente, um bom gestor de pessoas, muito bem visto dentro da organização. Espelhava-me muito nele profissionalmente e acreditava que era esse o caminho que queria seguir. Assim, fiz especialização em Administração, depois MBA, virei diretor e dividi essa ideia com esse gestor. Nunca tive um plano de longo prazo, ao contrário, meus objetivos sempre foram de curto prazo. As oportunidades iam aparecendo, eu avaliava se coincidiam com o que gostava de fazer e, assim, fui aproveitando algumas oportunidades, desenvolvendo competências e a carreira, e acabei chegando onde estou hoje. Entrei como estagiário em uma das áreas da ABB que foi vendida para a Alstom Energia, que depois foi vendida para a GE. Portanto, estou há mais de 20 anos na mesma companhia. Mas, quando comecei a trabalhar entendi que, mesmo estando no mesmo lugar, é difícil ficar fazendo a mesma coisa o tempo todo. Desde que entrei na ABB, já morei em três continentes diferentes, mudei de casa oito ou nove vezes e, a cada dois ou três anos, começava a desenvolver uma tarefa nova. Por mais que estives se debaixo do mesmo guarda-chuva, da mesma empresa, não me lembro de ter trabalhado na mesma área mais do que três ou quatro anos. Acho que essa é uma oportunidade que grandes empresas nos propiciam. Trabalhei em áreas de negócios diferentes, em merca dos diferentes, em posições diferentes, e acredito que é assim que conseguimos aprender. Quando aparecem novas oportunidades devemos avaliar se estão alinhadas com aquilo que gostamos de fazer e mergulhar.

Por que o senhor resolveu cursar Engenharia Mecânica na FEI?

Sempre gostei dos desafios mais difíceis e, quando estava no cursinho, tive uma noção de até onde poderia ir. Na época, diziam que era fácil de entrar na FEI e difícil de sair! Pensei: se é assim mesmo, é para lá que quero ir!

O senhor tem boas lembranças dessa época de faculdade?

Para mim era difícil, porque eu morava a 50 quilômetros da FEI. Era uma viagem! Tinha uma faculdade a cinco quilômetros da minha casa e meu pai sempre me perguntava por que eu havia escolhido estudar a 50 quilômetros de distância! Mas essa era uma parte do desafio de estudar na FEI. Como a maioria dos alunos cursava Engenharia, todo mundo pensava igual e queria a mesma coisa e, assim, formamos uma turma grande pensando igual. Os dois primeiros anos foram os mais difíceis, mas depois fiquei na mecânica porque era realmente o que eu queria ver e, no final, o último ano de produção para mim foi muito bom devido à liberdade que dava. Tenho boas lembranças da FEI.

O que o senhor projeta para o seu futuro profissional?

Sempre desejei para a minha carreira ter uma experiência internacional, que permitisse me desenvolver profissionalmente e pessoalmente fora do País. E tive a oportunidade de morar em dois lugares diferentes. Decidi voltar para o Brasil porque, a cada oportunidade, temos mais possibilidades de desenvolver a carreira. Estou como líder da Grid Solutions desde o começo deste ano e espero continuar liderando a divisão pelos próximos cinco anos, pelo menos, porque temos investido hoje para ter resultados lá na frente. Portanto, nos próximos anos espero estar no mesmo endereço, dando suporte tanto para a GE como para os colaboradores crescerem.

Qual é a sua expectativa em relação ao Brasil?

A minha principal expectativa é que o Brasil volte a crescer, mas que seja um crescimento de forma consistente, de forma íntegra e sustentável. Esse é o nosso principal objetivo e está muito alinhado com o que fazemos, com o porquê de fazermos. O maior desafio no Brasil, assim como nos outros países da América Latina, é essa gangorra de altos e baixos, e não acho que isso vá mudar. Mas aprendemos a criar experiências no passado para nos ajudar a lidar com isso.